Você sabe gozar?
Você sabe gozar?
Eu tive meu primeiro orgasmo com 11 anos de idade. Estimulei meu clitóris e tive um
orgasmo. Aprendi sobre masturbação feminina na aula de sexualidade na escola, acho
que fui uma das poucas crianças que estavam realmente prestando atenção na aula. O
cenário se dividia entre garotos que faziam piadas o tempo inteiro e já tinham o hábito
de se masturbar, e meninas extremamente constrangidas e coradas de tanta vergonha.
Mas antes disso eu já me excitava, desde muito pequena. No banho com o
"chuveirinho", sentada contorcendo as pernas, eu não sabia o que aquilo significava,
mas era bom.
Depois do meu primeiro orgasmo meus seios começaram a ficar mais visíveis, aos 13
minha menstruação desceu. E de repente eu percebi que eu não tinha a liberdade que
pensava ter.
Minhas amigas não falavam sobre a primeira menstruação, não falavam sobre
masturbação, não falavam sobre os pêlos, sobre as mudanças que vinham acontecendo.
Tudo era motivo para VERGONHA.
Eu nunca senti vergonha, mas passei a sentir raiva. Sentia raiva dos meus seios
apontando e atraindo olhares para o meu corpo, raiva do absorvente que marcava minha
calça jeans colada. Raiva dos pêlos que me obrigavam a me depilar toda semana.
Como era chato! Era chato crescer! Era chato ser mulher!
A única parte boa eram os orgasmos.
Minha única liberdade era a masturbação, e ela não era guiada por nenhum tipo de
pensamento, era um momento meu, comigo mesma, onde eu me sentia livre.
Com 14 anos tive meu primeiro namorado, e o interesse por sexo veio pela primeira vez
(nunca havia sentido vontade de transar, porque eu já me satisfazia comigo mesma).
Mas vieram os primeiros toques, o calor proporcionado por outra pessoa. Foi aí que
decidi assistir filmes eróticos para "aprender" a transar. DECEPÇÃO!
Eu senti nojo, muito nojo, onde estava o estímulo? O prazer? A intimidade? Era tudo
tão brutal, as mulheres não gozavam, só os homens gozavam, e no ROSTO delas.
Não transei. Decidi que se aquilo era sexo, eu não o faria.
Amava o orgasmo, mas odiava o sexo. O sexo que era mostrado não era o que eu
esperava.
Aos 17, já com o segundo namorado, minha curiosidade por sexo aumentou, mas ao
mesmo tempo minha auto estima me deixava travada. A vagina das atrizes pareciam
perfeitas! Totalmente depiladas, ou com uma depilação bem desenhada e atraente, o
clitóris na maioria das vezes era "escondido" não era avantajado, tudo muito "delicado".
Decidi transar, mas com a luz apagada, porque eu não queria que meu corpo fosse
comparado com os corpos "perfeitos" das atrizes de filme pornô.
Bom, eu não gozei. Nem na primeira, nem na segunda, nem na terceira vez. E aquilo
não era normal pra mim, eu queria gozar! Eu sabia gozar!
Eu estava pronta, mas ela não sabia como me tocar.
Foi aí então que eu percebi que os homens não aprendem sobre o prazer da parceira,
eles aprendem sobre performance. Sim, tem que saber "bombar" direito, tem que saber
"meter" botar "pressão". Eles não aprendem nada sobre sexo oral, sobre estimulação do
clitores. Eles não aprendem a excitar nossa mente.
Continuava amando o orgasmo mas odiando o sexo.
E de repente eu me peguei ensinando meu namorado a masturbar uma mulher, porque
eu queria gozar, eu sabia gozar. E eu gozei.
Depois gozei com sexo oral, e por último com penetração.
Mas, eu me deparei com o seguinte pensamento: será que eu conseguiria ter um
orgasmo numa relação sexual se nunca tivesse tido um orgasmo sozinha?
Todos os homens tem o primeiro orgasmo sozinhos, eles sabem gozar. Mas, e nós
mulheres? Nós sabemos? Nós nos conhecemos? Somos estimuladas para ter esta
experiência?
Não, não somos estimuladas, não somos incentivadas, muito menos encorajadas a
conhecer nossos corpos.
Sentimos raiva de nossa natureza, somos ensinadas a odiar os processos do nosso corpo.
O que me salvou foi ter descoberto a sexualidade antes de ser ensinada a odiar meu
próprio corpo, o que me salvou foi ter intimidade comigo mesma.
E hoje, aos 21 anos, eu aprendi a ser completamente apaixonada por meu corpo, minha
natureza, minha sexualidade. Eu me libertei de toda a raiva que cultivei por mim. E eu
percebi que eu só teria um orgasmo pleno depois que me libertasse da péssima educação
sexual que nós mulheres recebemos, que sequer pode ser chamada de educação, está
mais para submissão. É extremamente triste ver garotos tendo a sexualidade definida
através de filmes nojentos que passam longe da verdadeira essência do sexo. Eles
aprendem a estimular um pênis mas não sabem estimular um corpo (nem o próprio
corpo).
Saber gozar é se amar, se priorizar, estar acima de tudo em primeiro lugar. É não aceitar
um sexo mais ou menos só para agradar seu parceiro. Saber gozar é estar em harmonia
com o próprio corpo.
Eu tive meu primeiro orgasmo aos 11, mas eu só gozei de verdade quase dez anos
depois. Quando me libertei da raiva e da vergonha que sentia por mim.
Helena Ferreira