Ambiguidade na relação abusiva
- Walter Miez
- há 14 horas
- 2 min de leitura

O relacionamento abusivo é uma trama complexa porque se constrói sobre a ambiguidade da violência e do suposto afeto. A mesma pessoa que oferece aconchego é quem desestabiliza; quem diz apoiar sua caminhada é também quem sabota seus passos. Essa contradição constante é o que torna o abuso tão difícil de identificar e, principalmente, de romper. Se a relação fosse apenas feita de dor explícita, de violência evidente, seria mais fácil reconhecer o padrão tóxico e se afastar com clareza e convicção. Mas o abuso, na maioria das vezes, se manifesta de forma sutil, intermitente, disforme.
A pessoa abusadora se instala aos poucos no campo da intimidade. Assume um lugar de cuidado, de escuta, de amor, o que cria uma ligação afetiva forte, que parece genuína. É nesse espaço que ela começa a plantar dúvidas, a minar a autoconfiança, a criar inseguranças que não estavam ali antes ou que estavam adormecidas. Ela se coloca como única fonte de afeto e, ao mesmo tempo, como o centro da instabilidade emocional da outra pessoa. Isso gera uma dinâmica de dependência emocional profunda, na qual o afeto e a dor andam lado a lado, confundindo os sentidos e diluindo as fronteiras do que é aceitável.
Essa intermitência do afeto e da violência, da presença e da sabotagem, é o que prende. A esperança de que o lado amoroso prevaleça, de que o cuidado seja real e constante, mantém a vítima em ciclos de espera, de culpa, de justificativa. Por isso, é tão importante nomear essas experiências, reconhecer os sinais e entender que amor não é feito de sofrimento constante, nem de confusão emocional. O vínculo abusivo é perverso justamente porque se mascara de afeto e é desmascarando essa ilusão que começa o caminho a emancipação desse controle.
Comentários